24 de novembro — São João da Cruz († 1591)

Extraído de uma edição de 1935 do livro “Na Luz Perpétua — Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus, para todos os dias do ano, apresentadas ao povo cristão” 1

Foi no ano de 1542 que em Fontiveros, pequena localidade de Castela, nasceu João da Cruz, hoje venerado como grande Santo na Igreja inteira. Depois da morte prematura do pai, a mãe se mudou para Medina del Campo, onde João iniciou os estudos e entrou na Ordem de Nossa Senhora do Carmo. Desde a infância o distinguiu sempre uma terna devoção a Maria Santíssima, que mais de uma vez lhe conservou a vida, milagrosamente. O que raramente se observa em meninos: o desejo da mortificação, em João era bem pronunciado, quando contava apenas 9 anos. Escolhendo para si um leito duro, poucas horas de sono dava ao corpo, castigando-o ainda com jejuns assaz rigorosos. Estudante, ainda tinha por ocupação predileta visitar os doentes nos hospitais e prestar-lhes serviços.

Uma vez feito religioso, não se satisfazia com as praxes disciplinares usuais: tinha o intento de moldar a vida religiosa pelo rigor antigo da Ordem. Tendo chegado o dia da celebração da primeira Missa, examinou a consciência com o maior escrúpulo; não achando falta com que tivesse gravemente ofendido a Deus, deu muitas graças, pedindo a Nosso Senhor que o preservasse sempre do pecado mortal. Esta oração foi ouvida, concedendo-lhe Deus a graça da inocência até a morte. Alcançou na perfeição um grau tão elevado, que na sua vida não há exemplo de pecado venial deliberado.

Santa Teresa de Jesus, que lhe foi contemporânea, considerava-o santo e afirma que nunca lhe observou a mínima falta. A mesma Santa conheceu São João da Cruz, por ocasião da fundação de um convento em Medina del Campo. João, levado pela inclinação à vida austera, tencionava entrar na Ordem dos Trapistas, mas antes de tomar qualquer resolução definitiva neste sentido, pediu o conselho de Santa Teresa. Esta lhe disse, que mais acertado andaria e mais do agrado de Deus, se permanecesse na Ordem Carmelita e se incumbisse também da reforma da disciplina regular; era esta a vontade de Deus. João apresentou este plano a Deus nas orações e ao confessor, e decidiu seguir a opinião de Santa Teresa. Em pouco tempo conseguiu com a graça de Deus, a reforma de alguns conventos da Ordem. A opiniões contrárias fechava os ouvidos, dizendo que o caminho estreito para o céu não exigia coisa de menos valor.

Só Deus conhece os sofrimentos, perseguições e injúrias de que o reformador foi alvo no cumprimento da nobre missão. João não procurava honra própria. O amor de Deus era a única força motriz, que o impelia a trabalhar e sofrer por Deus. Jesus Cristo, em uma aparição com que se dignou de distinguir a seu servo, perguntou-lhe pela recompensa que esperava dos trabalhos e sofrimentos. João respondeu: “Não outra coisa, Senhor, senão sofrer por vosso amor e ser desprezado pelos homens”.

Eram três coisas que pedia a Deus que lhe concedesse: primeiro, dar-lhe força para trabalhar e sofrer muito; segundo, não o fazer sair deste mundo como superior de uma comunidade e terceiro, deixá-lo morrer desprezado e escarnecido pelos homens. Este desejo de ser desprezado era o fruto da meditação constante sobre a sagrada Paixão e Morte de Jesus Cristo. Falando neste grande mistério da nossa Religião, o semblante ardia-lhe, e durante a celebração da santa Missa lhe era frequente o estado extático e dos olhos lhe corriam abundantes lágrimas. Nosso Senhor Jesus Cristo mostrou-se-lhe uma vez na figura que tinha, quando morreu na cruz. Esta imagem ficou tão profundamente gravada na memória do Santo, que não podia recordá-la sem chorar. A todos que com ele se relacionavam, João da Cruz recomendava com muito empenho as devoções ao Salvador crucificado, à Santíssima Trindade, ao Santíssimo Sacramento. Os pecadores mais empedernidos não resistiram à eloquência e ao zelo do fervoroso Carmelita e muitos lhe deveram a conversão. É inegável que a graça divina muito o auxiliou, na grande influência que exercia sobre os corações. A muitos pecadores desvendou os pecados mais ocultos, em muitos casos predisse o futuro, doentes desenganados recuperaram a saúde em virtude de sua palavra. Muitas vezes lhe apareciam Maria Santíssima, São José, São João e o próprio Salvador. Memoráveis são as aparições, com que foi consolado durante a prisão de nove meses, a que injustamente fora condenado.

Em 1591 foi o fiel servo de Deus chamado à eterna recompensa. Uma longa e dolorosa doença precedera-lhe a morte. Quando os médicos lhe comunicaram a incurabilidade da moléstia, disse João as palavras do salmista: “Muito me alegrei em ouvir dizer isto; hei de entrar na casa do Senhor”. Meia hora antes da morte mandou reunir os confrades, exortou-os à perseverança e disse: “São horas de eu partir.” Quando ouviu o sino bater meia noite, hora em que a comunidade costumava cantar as matinas, exclamou: “Eu as cantarei no céu!” Depois tomou o crucifixo nas mãos, beijou-o ternamente, dizendo: “Em vossas mãos encomendo o meu espírito”.

O Papa Bento XIII conferiu-lhe a honra dos altares em 1726.

REFLEXÕES

Na primeira santa Missa São João da Cruz pediu a Deus a graça de ficar isento de todo o pecado mortal. Em outra ocasião pediu para sofrer muito, trabalhar pela glória de Deus e ser desprezado e ludibriado por amor de Cristo. Bem diferente é tua oração. Que é que pedes a Deus? Em que intenções prometes a Deus santas Missas, jejuns e romarias? Não é quase sempre para obter favores materiais: restabelecimento de tua saúde ou da saúde de outros, felicidade nos negócios, etc. Os interesses de tua alma não são muito mais elevados? E deles, no entanto, não te lembras. Porque não fazes petições e promessas para alcançar a graça da perseverança, a graça de ficar livre do pecado mortal, de vencer tuas paixões e vícios? “Pede, — diz o cardeal Hugo — pede a Deus tudo que é útil e necessário para tua salvação”.

Santos cuja memória é celebrada hoje:

O martírio de São Crisógono em Aquileia. Morreu no tempo de Diocleciano.

Em Amelia, na Úmbria, na mesma perseguição diocleciana, o martírio de Santa Firmina, virgem. Morreu suspensa e queimada.

Em Tonquim, no ano de 1838, o martírio do bem-aventurado Pedro Borie, do Seminário de Paris. No mesmo dia a morte dos dois sacerdotes indígenas, Diem e Khoa.

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  1. PDF desse livro disponível em: https://archive.org/details/pe-joao-baptista-lehmann-na-luz-perpetua-vol-ii 

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