27 de novembro — São Tiago, o Mutilado († 421)

Extraído de uma edição de 1935 do livro “Na Luz Perpétua — Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus, para todos os dias do ano, apresentadas ao povo cristão” 1

De origem persa, Tiago nasceu em Bethlapeta. Alta linhagem, grandes e fulgurantes talentos, avultada fortuna, posição saliente, distinções honrosíssimas, que lhe vinham do monarca persa, fizeram com que o nome de Tiago fosse por todos muito honrado, mas também o levaram à beira do abismo. Quando o Rei da Pérsia anunciou uma perseguição ao cristianismo, Tiago teve a fraqueza de negar a fé, o que grande tristeza causou à esposa e à mãe. Morto o Rei Isdegardes, escreveram a Tiago esta carta: “Sabemos que abandonaste o amor e a fidelidade de Deus imortal, para ganhar o agrado do Rei, os bens e glórias deste mundo. Qual foi o fim daquele, por amor do qual perdeste um tesouro tão grande?

O miserável teve a sorte de todos os mortais… Dele nada mais podes esperar, nem tão pouco te libertará das penas eternas. Sabe que a divina justiça te condenará às penas do inferno, se continuares na tua infidelidade. Quanto a nós, não desejamos mais ter comunicação contigo”. A leitura destas palavras impressionou-o profundamente. Caindo em si, abandonou a vida na corte e renunciou a todas as vantagens, que as relações com a aristocracia lhe tinham conferido. Ao novo rei declarou francamente que era cristão e como tal desejava viver. O monarca abalou-se com esta declaração e, indignado, acusou-o de ingratidão, apontando para os grandes benefícios que do pai tinha recebido. “Onde está aquele príncipe?”, perguntou Tiago. “O que foi feito dele?”. Estas palavras ainda mais irritaram o Rei, que respondeu com ameaças de morte lenta e cruel. Tiago replicou: “Qualquer feição que a morte tome, é apenas um sono… Oxalá possas ter a morte de um justo”. O Rei: “Não, a morte não é um sono; para todos, grandes e pequenos, é um objeto de horror”. Tiago: “Não há dúvida; horrorosa é para os reis e todos os que desprezam a divindade, porque vã é a esperança dos ímpios.” O Rei: “Chamas-me de ímpio, miserável, tu, que não adoras o sol, a lua, o fogo e a água, as emanações mais sublimes da divindade?” Tiago: “Não intenciono ofender-te; o que digo e censuro é dares a criaturas o nome de Deus, o que não deve ser”.

O Rei, ouvindo isto, não mais se conteve. Convocou os ministros, conselheiros e juízes, para que com ele determinassem de que modo deveria morrer aquele, que tão afrontosamente tinha ofendido e ultrajado as divindades do reino. Tiago foi posto na prisão e condenado à morte de mutilação. Se não quisesse prestar homenagem às divindades, deveriam ser-lhe amputados os membros do corpo, um por um. Profunda foi a impressão que esta sentença causou entre o povo. Todos afluíram ao lugar do suplício, para serem testemunhas da cruel execução. Os cristãos, por sua vez, pediram a Deus a graça da perseverança para o seu servo.

Antes de ser executado, Tiago, com o rosto virado para o oriente, de joelhos e os olhos fitos no céu, fez uma oração. Depois se lhe aproximaram os algozes que, de acordo com a sentença, lhe amputaram dedo por dedo, depois as mãos, os braços, os pés e as pernas. Tiago sofreu horrivelmente, mas não vacilou.

No meio das cruéis operações disse: “Esta morte, que vos parece tão pavorosa, é preciosíssima, por produzir a vida eterna”.

Quando lhe cortaram o polegar da mão direita, o mártir disse: “Salvador dos cristãos, aceita este galhosinho de árvore. Esta árvore entrará em decomposição; mas reviverá, cobrir-se-á de folhagem e receberá a coroa da glória eterna.” Os próprios juízes, assistindo ao horrível martírio de Tiago, ficaram movidos de compaixão e pediram-lhe que tivesse pena do corpo e salvasse a vida, ao que o servo de Deus respondeu: “Não sabeis que não é digno de Deus aquele que, tendo posto a mão no arado, olha para trás?” Cada articulação que perdia, era oferecida a Deus com estas palavras: “Aceitai mais este galho”.

Não havendo mais nada para cortar, Tiago disse aos algozes: “Abatei agora o tronco. Não vos deixeis mover por compaixão de mim. Estou satisfeito e minha alma alegra-se no Senhor e inclina-se para aquele que ama os pequeninos e humildes”.

Horrivelmente mutilado, o mártir ainda estava com vida, louvando a Deus. Por último, foi-lhe decepada a cabeça. Da maneira como lhe foi praticado o martírio, Tiago recebeu o cognome de mutilado.

A data da morte do mártir foi o dia 27 de novembro de 421.

Os cristãos juntaram-lhe as preciosas relíquias e imploraram-lhe a intercessão junto de Deus.

REFLEXÕES

Depois de longos anos, passados entre práticas de virtudes, São Tiago teve a infelicidade de perder a fé. Este fato confirma a verdade de que jamais o homem se deve entregar à confiança nas próprias forças. “Por mais santo que alguém seja, não se julgue tão seguro, como se fosse impossível uma queda”, diz Santo Efrém. São Teodoreto escreve: “Não me diga: eu encaneci na virtude, nada mais receio. A queda ou uma alteração todos devem temer. Satanás precipitou já muitos no abismo dos vícios e da condenação, entre eles também indivíduos que envelheceram na virtude”. Santo Agostinho afirma que conheceu homens, cuja santidade parecia atingir às estrelas do céu e que caíram no abismo dos vícios e ali permaneceram. Na convicção de tua fraqueza, pede a Deus, todos os dias, que te conserve na graça. Desconfiar de si, confiar em Deus, pedir força e perseverança, são três coisas de que o cristão nunca se deve esquecer. Na observância desta regra está toda a sua força. São Tiago reconheceu o erro e voltou pelo caminho do arrependimento e da penitência. Oxalá o quisessem seguir todos aqueles que sucumbiram na luta contra as tentações, que o próprio orgulho, maus homens e o demônio lhes prepararam, e agravaram a consciência. “Não pecar é próprio de Deusdiz Santo Ambrósio —, mas abandonar o pecado e emendar-se é o que deve fazer o homem sábio”.

Santos do Martirológio Romano, cuja memória é celebrada hoje:

Na Índia, os santos Barlaão e Josafá, cujas grandes obras mereceram o elogio de São João Damasceno.

No rio Cea, na Espanha, a memória dos santos Facundo e Primitivo, mortos por ordem do governador Ático.

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  1. PDF desse livro disponível em: https://archive.org/details/pe-joao-baptista-lehmann-na-luz-perpetua-vol-ii 

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